quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Tolerância



 O PARADIGMA DA TOLERÂNCIA

 "A TOLERÂNCIA É A MELHOR DAS RELIGIÕES."
Victor Hugo
Tolerância é o ato de respeitar as diferenças. É colocar em prática um dos pilares da ética universal. É agir com base em valores integrais, que não dizem respeito a crenças provisórias e passageiras, muito embora o ser que tolera se sirva delas para fazer da atitude tolerante uma postura definitiva, que marque o seu tempo e a sua vida.
É a falta de tolerância a causa de homens fanatizados se transformarem em bombas vivas, levando consigo outras tantas vidas por causa da incapacidade de conviver com visões de mundo e de Deus diferentes das próprias. Essa tese pode ter seu alcance estendido para outro ambiente, o da Casa Espírita, onde companheiros de convicção partilham ideais semelhantes, na busca de concretizá-los pela prática do bem, e nem sempre se utilizam da tolerância para superar ruídos da convivência.
A conduta tolerante é tão importante para o pensamento doutrinário que até Allan Kardec a colocou em destaque, ao afirmar que tolerância, trabalho e solidariedade são pilotis fundamentais em qualquer obra voltada para o bem da Humanidade.
Será que se deve tolerar tudo? O bom senso sugere que não... por que não tolerar também o Mein Kampf, de Hitler? E, se tolerarmos o Mein Kampf, por que não o racismo, a tortura, os campos de concentração? Compreende-se que uma tolerância universal é moralmente condenável. Resta, portanto, propor uma forma existencialmente pragmática e eticamente aceitável de concebê-la como valor real, a ser colocado em prática, tal como Kardec sugere aos espíritas...
...Uma dúvida: E quando o que está em jogo é um aspecto doutrinário uma maneira de entender este ou aquele tema, ou de que forma ele vai ser aplicado nas atividades da Casa Espírita? Como fazer quando opiniões divergentes se chocam e não há a vigilância necessária para que a postura da tolerância supere as rusgas das divergências?
Não vejo inspiração maior para deixar-se mergulhar no aroma da tolerância senão lembrar-se da figura ímpar do Codificador. Allan Kardec superou duras provas de paciência ao ser a primeira grande vítima dos ataques impiedosos da ignorância letrada, que o acusava de todo tipo de falcatrua para denegrir a nova visão de mundo e de além-mundo que chegava.
Kardec não tolerou aqueles que caminhavam com ele. Esses, ele os amou. O professor exerceu a tolerância em mais alto grau para com os que o detratavam, não sem oferecer-lhes as explicações seguras e profundas do que justificava seus argumentos...
Para o filósofo francês contemporâneo André Comte-Sponville, tolerar é responsabilizar-se, pois a tolerância que responsabiliza o outro não é tolerância. “Tolerar o sofrimento dos outros”, diz o autor, “tolerar a injustiça de que não somos vítimas, tolerar o horror que nos poupa não é mais tolerância: é egoísmo, é indiferença”.
Nesse caso, tolerar Hitler seria tornar-se cúmplice de seus crimes. Seria suportar intelectualmente uma dor que não vivemos junto daqueles que sofreram as consequências atrozes da perseguição aos judeus, durante a Segunda Guerra Mundial.
A tolerância de Kardec foi sempre acompanhada da responsabilidade do esclarecimento; logo por ele, o missionário da verdade, a quem cabia tirar o véu da ignorância e do desconhecimento da realidade espiritual. Tolerar é vestir de nobreza o trabalho solidário.
Eis um dos grandes desafios que a Casa Espírita tem a vencer. Ao espírita, cabe abraçar a mesma causa, fazendo com que a presença na sociedade espírita seja cada vez mais agradável, porque ele sabe que está entre irmãos de ideal, tão precisados quanto ele do saudável remédio da tolerância para seguir adiante em seu trabalho no bem.
(Por Carlos Abranches – Reformador/Março, 2004).